quarta-feira, 16 de julho de 2008

Joseph Beuys


Se na primeira metade deste século, Pablo Picasso e Marcel Duchamp dividiam a primazia de serem considerados os "gênios da criação" na arte; na segunda metade, Andy Warhol e Joseph Beuys passaram a formar seus próprios epítomes. O "no futuro todo mundo será um artista", de Warhol, e o "pensar é esculpir", de Beuys, podem ser traduzidos como a visão mais elaborada da antiarte, da derrocada do artista e sua visão platônica de mundo. Esse vatícinio, no entanto, longe de parecer fatídico, carrega em si uma esperança ainda maior no homem como ser criador.
O denken ist plastik (pensar é esculpir) de Beuys revela o desejo de ruptura entre o homem e a realidade aparente. Seu conceito de realidade abrange o tempo e o espaço, a cultura e a natureza, a utopia e a existência, propulsores e paradigmas humanísticos da arte. A unidade entre vida e obra era para Beuys mais importante que o valor estético, já que exigia do espectador uma participação mais efetiva. Suas obras estão impregnadas dessa realidade e exercem uma impressão direta sobre os observadores.
Suas idéias, seu modo engenhoso de se apropriar de diversos materiais, sua fabulosa capacidade de formulação plástica e domínio técnico, fizeram dele o artista deste século que melhor empreendeu a questão da multiplicidade da obra de arte. E é nos objetos que esta realidade se torna ainda mais evidente. Ao se apropriar de uma garrafa de água, uma sacola de papel de supermercado, uma bandeja de papelão, ou fotografias velhas, o artista empresta outro significado à ação criadora. A prática da arte em Beuys se dá sempre pela vontade, pelo pensamento e sentimento como modo de realizar a vida. Essa idéia de arte transformadora que perpassa sua obra é a história da cultura, do próprio devir.
Graças a uma linguagem figurada, repleta de símbolos e metáforas, Beuys busca o conhecimento das conexões existenciais no inconsciente coletivo, trazendo-os para outro plano, desta vez consciente. Sua obra quer exibir uma realidade concreta, por isso o uso de materiais sem importância e simples. Para o crítico e historiador Giulio Carlo Argan se a sociedade de amanhã ainda considerar que a experiência estética é a única capaz de garantir uma experiência individual livre e reativa com o mundo, e realizar essa experiência com os meios de seu sistema, a arte já não se fará com pincel ou argila, mas, como memória e reflexão, influirá positivamente sobre os novos modos da experiência estética. A obra de Beuys é a mais perfeita tradução deste enigma. Seu apreço pela multiplicidade dos objetos tem razões objetivas. "É uma questão de duas coisas que se intersectam. Obviamente eu procuro uma qualidade propícia em um objeto que permita a sua multiplicação. Por exemplo, a qualidade sugerida de uma série encontrada na garrafa de água tônica Evervess. Exatamente por ser um artigo comercial, esta garrafa é capaz de comunicar muito através de sua repetição. Para mim, cada edição tem o caráter de um núcleo de condensação sobre o qual muitas coisas podem se acumular", argumentou Beuys a respeito da origem e significado dos múltiplos.
Sua arte pretende reconstituir espiritualmente a unidade do homem, devolver-lhe a energia e tensão para transformar sua relação com o mundo. Natureza, civilização, homem e técnica, passado, presente e futuro, arte e vida, são dimensões iguais. Sua obra também revela a ruptura entre o homem e a realidade que o cerca, mas o seu entendimento de realidade é muito mais complexo do que o de um autodesignado gestor de crises: corresponde a uma interpretação com dimensões ainda universais. O conceito de universal em Beuys manifesta-se igualmente no conjunto de sua ação artística, educacional e política. Nas esculturas, nos happenings, nos desenhos, nas ações fotografadas e filmadas; nas declarações para rádio e TV, essa visão universal de mundo está sempre presente.
Românticas, nunca realistas ¬ é como devem ser consideradas sua obra e sua compreensão de mundo. Como os românticos, Beuys via na arte um meio de formação e educação do ser humano, atribuindo a ela um papel de reconciliação do homem com o mundo, assim analisa o crítico Luís Camillo Osório. Para ele, as obras de Beuys são criadas de forma a transmitir um significado das energias que dão sentido à vida. Por isso elas mais perguntam que respondem. "A força da sua obra e o espírito que a fomenta, permitem compreendê-la como uma tentativa de recuperar algumas premissas essenciais da estética romântica, principalmente no que concerne seu caráter formativo que dota de uma dignidade espiritual comparável à da religião e da filosofia".
A produção artística de Beuys apontava os aspectos positivos da técnica, retirando da equação homem x máquina = natureza uma simbologia e uma força transformadora. Se em Beuys a cultura era determinante na criação, em Warhol era resultante desta. Em ambos, o desejo da criação do mito. O artista pop, com as revoluções imediatas dos anos 60, via nos paraísos artificiais da sociedade de consumo uma manifestação inequívoca de um novo modelo de humanismo; para o alemão do grupo Fluxus, uma distanásia.


Paulo Reis é jornalista, crítico de arte e curador da Galeria Catete do Museu da República. Foi curador assistente do MAM-RJ, realizou diversas exposições individuais e coletivas entre elas: Camile Claudel, esculturas; Modernismo Internacional na Coleção MAM e O Feminino. A solidão absoluta

2 comentários:

Anônimo disse...

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Anônimo disse...

Yutarets! kasagad bah!