domingo, 25 de novembro de 2007
Glauber Rocha e o Cinema Novo
CINEMA NOVO
“O cinema novo não é uma questão de idade; é uma questão de verdade.”
Paulo Cezar Saraceni
Na virada dos anos 50 para os anos 60, uma série de jovens, vindo dos mais distintos lugares, com as mais distintas formações, propunha uma nova maneira de fazer cinema no Brasil. Não mais o cinema artificial e empolado dos estúdios como a Vera Cruz, mas um cinema que tomasse as ruas e fosse ao encontro da sociedade brasileira, incorporando novas formas de linguagem e renovando as questões estéticas e culturais do Brasil. Em 1960, depois das primeiras exibições dos curtas-metragens Arraial do Cabo, de Paulo Cezar Saraceni e Mário Carneiro, e Aruanda, de Linduarte Noronha e Rucker Vieira, o então jornalista Glauber Rocha escreveu para o Suplemento Literário do Jornal do Brasil saudando o nascimento de uma nova geração de cineastas. Nasce aí a idéia do cinema novo, que rápido incorpora jovens jornalistas e intelectuais com sensibilidades semelhantes. Grupos vão se formando, essencialmente na Bahia, num ambiente de efervescência cultural capitaneado por Guido Araújo e Walter da Silveira, e no Rio de Janeiro, através das sessões e dos ciclos organizados pela Cinemateca do MAM.
Os primeiros longas-metragens surgem na Bahia: A Grande Feira, de Roberto Pires, Bahia de Todos os Santos, de Trigueirinho Neto e Barravento, de Glauber Rocha, começam a trabalhar no sentido da inovação e do despojamento de linguagem, com ênfase na temática social.
No Rio de Janeiro, alguns jovens ligados ao CPC da UNE decidem fazer um filme que deslanche o Cinema Novo na cidade. É Cinco Vezes Favela, filme em cinco episódios dirigidos por Joaquim Pedro de Andrade, Leon Hirszman, Carlos Diegues, Miguel Borges e Marcos Farias. Vão aparecendo novos longas: Garrincha, Alegria do Povo, Porto das Caixas, de Joaquim Pedro de Andrade, Vidas Secas, de Nelson Pereira dos Santos, Ganga Zumba, de Carlos Diegues. Os filmes começam a ganhar prêmios no exterior e reconhecimento no país.
Mas é o Festival de Cannes de 1964 que vai garantir uma projeção maior ao movimento. Deus e o Diabo na Terra do Sol, de Glauber Rocha, e Vidas Secas ganham uma enorme acolhida por parte da imprensa européia e, mesmo sem ganhar prêmios oficiais, se transformam na sensação do Festival. Os jornais brasileiros relatam com efusividade a repercussão dos filmes e saúdam Deus e o Diabo na Terra do Sol como o ápice do cinema brasileiro. A sociedade brasileira agora discute o Cinema Novo.
Os anos seguintes são de consolidação: Os Fuzis, de Ruy Guerra, A Falecida, de Leon Hirszman, O Padre e a Moça de Joaquim Pedro de Andrade, O Desafio de Paulo Cezar Saraceni, A Grande Cidade, de Carlos Diegues, Menino de Engenho de José Lins do Rego dão continuidade ao movimento tratando de uma infinidade de temas: as condições de vida precária no seco nordeste do país, as paranóias da classe média baixa urbana, a questão do retirante nordestino nas grandes cidades, o posicionamento do intelectual diante da ditadura. Há também espaço para olhares mais líricos, como uma paixão proibida surgindo numa cidadezinha de Minas Gerais ou a infância de um menino num engenho de açúcar nos anos 20.
Em 1967, nasce um escândalo. Terra em Transe, de Glauber Rocha, filme proibido pela ditadura brasileira, é exibido e premiado no Festival de Cannes. O filme, extremamente dinâmico e com proposta inovadora, choca os mais conservadores com seu amálgama das experiências políticas dos países latino-americanos, entre as oligarquias ancestrais, as grandes empresas imperialistas, o populismo e a mistificação política.
Com o recrudescimento da ditadura, falar de política e de sociedade passa a exigir certa cautela, e os temas dos filmes ficam progressivamente mais cifrados, originando narrativas metafóricas. Surgem filmes como Fome de Amor de Nelson Pereira dos Santos, Brasil Ano 2000 de Walter Lima Jr., Os Herdeiros de Carlos Diegues ou Pindorama de Arnaldo Jabor, todos tentando refletir o estado da sociedade nacional.
No final da década de 60, o Cinema Novo lança dois de seus filmes mais importantes: O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro, de Glauber Rocha, e Macunaíma, de Joaquim Pedro de Andrade. Ambos em cores (ao contrário da maioria do cinema novo, que foi feita em preto e branco), os filmes propõem um maior alcance com a linguagem popular, inaugurando um outro momento do cinema brasileiro e preconizando uma fase mais industrial – formalizada com a criação da estatal Embrafilme –, que teria curso nos anos 70. Os cineastas do Cinema Novo continuam fazendo filmes, só que separados, cada um por si: a união desaparece, mas os temas e o desejo de criar um olhar novo sobre o Brasil e o mundo perduram. Até hoje.
Frases:
"Nosso cinema é novo porque o homem brasileiro é novo e a problemática do Brasil é nova e a nossa luz é nova e por isso nossos filmes nascem diferentes dos cinemas da Europa."
"No Brasil, o Cinema Novo é uma questão de verdade e não de fotografismo. Para nós, a câmera é um olho sobre o mundo, o travelling é um instrumento de conhecimento, a montagem não é demagogia mas a pontuação do nosso ambicioso discurso sobre a realidade humana e social do Brasil!"
"A colonização não se racha em Hollywood que pode contratar vários diretores brasileiros para trabalhar. Mas o importante não é fazer carreira pessoal. Importante é ter consciência. O fundamental é lutar para libertar o mercado nacional."
"Felizmente o Cinema Novo não perdeu a cabeça na vaidade provinciana, depois de ter rachado com a colonização cultural no próprio berço da colonização. "
"O cinema é, antes de tudo, uma indústria, inclusive se é dirigido contra a indústria."
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